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Não é novidade que a esperança média de vida tem vindo a aumentar nas últimas décadas, fruto do desenvolvimento da ciência e das melhores condições de vida. Este é um facto muito positivo do qual devemos ter orgulho, pois conseguimos viver mais anos. Mas a questão que se coloca é como queremos viver estes anos. Viver mais não significa viver melhor, mas todos almejamos viver o máximo de tempo possível de preferência com conforto e qualidade.

A realidade com que nos deparamos hoje é a de uma sociedade cada vez mais marcada pelo envelhecimento e, consequentemente, pelo aumento de doenças crónicas, o que conduz ao incremento das necessidades de saúde deste segmento da população. A família tem a responsabilidade e um papel fundamental na prestação de cuidados no domicílio no que diz respeito à promoção do conforto, bem-estar e qualidade de vida das pessoas em situação de dependência. O facto de existirem cada vez mais casos de pessoas com elevado grau de incapacidade não influencia apenas o individuo dependente, mas também a sua família, amigos e o seu cuidador informal, pois precisam da ajuda de terceiros para sobreviver.

Cuidar tem um custo e é importante que isto seja assumido. Tem um custo físico, financeiro, social e emocional. Muitas vezes o cuidador abdica da sua própria “vida”, no sentido que deixa de viver de acordo com as suas necessidades para se concentrar nas necessidades do outro. A sua vida fica em “suspenso”.

Segundo o estudo “Saúde mental e bem-estar nos cuidadores informais em Portugal”, uma iniciativa da Merck Portugal, com apoio do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais; mais de 80% dos cuidadores informais reconhecem que já estiveram em exaustão emocional e quase 78% sentiram, em algum momento, necessidade de apoio psicológico. Porém, apenas 42% procuraram esse tipo de ajuda. Esta discrepância é especialmente preocupante se tivermos em conta que quase 80% acredita que o seu estado de saúde emocional influencia o desempenho como cuidadores informais.

Se até ao momento tínhamos a noção de que era importante mudanças nas políticas de saúde, agora cada vez mais temos certezas. Apesar do grande avanço social com a criação do Estatuto do Cuidador Informal em 2019, mantêm-se algumas injustiças na burocratização dos procedimentos, tornando-se essencial que algumas adaptações sejam feitas.

Cabe à sociedade mudar a forma como olha para os cuidadores informais e cabe a todos os intervenientes sociais e políticos fazerem o seu papel.

A Junta de Freguesia do Caniço iniciou o projeto de intervenção comunitária “Ser Cuidador Informal” em 2018, projeto que ainda hoje mantém. Este projeto foi muito bem recebido pela população local e tem como objetivos promover a capacitação dos cuidadores informais para o desempenho deste papel, assim como prevenir a sobrecarga e stress no cuidador. Desta forma, contribuímos para que as pessoas que necessitam de apoio no desempenho das suas atividades de vida permaneçam no seu ambiente em segurança e conforto e também que os cuidadores consigam permanecer mais saudáveis física e mentalmente. Este projecto de intervenção, dirigido aos cuidadores informais, foi recentemente distinguido com o selo de Mérito do Movimento Cuidar dos Cuidadores Informais no âmbito da 2.ª Edição da Rede de Autarquias que Cuidam dos Cuidadores Informais (RACCI).

Na Lei n.º 100/2019, de 6 de setembro, que aprova o estatuto do Cuidador Informal, estão patentes os seus direitos, entre os quais os de reconhecimento do seu papel na sociedade, de receber informação e formação para prestar cuidados mais seguros, assim como de usufruir de períodos de descanso e apoio emocional quando necessário. Estes são direitos legislados e que devem ser respeitados.

No mesmo patamar de importância dos direitos, estão os deveres dos cuidadores informais. Estes têm o dever de garantir o acompanhamento necessário ao bem-estar global da pessoa cuidada, promover um ambiente seguro respeitando a sua individualidade e privacidade, assim como procurar apoio dos profissionais de saúde sempre que necessário.

Se os direitos e deveres de quem cuida fossem cumpridos e devidamente reconhecidos poderíamos evitar muitas situações trágicas que alguns idosos vivem atualmente.

Paula Franco

Observação:

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